CONTROLADO O INCÊNDIO QUE DESTRUIU O MUSEU NACIONAL, A PRIMEIRA INSTITUIÇÃO CIENTÍFICA DA HISTÓRIA DO PAÍS. | Revista REDE
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Fogo começou por volta de 19h30, quando o prédio já estava fechado para os visitantes Calcula-se que o acervo tenha 20 milhões de itens. | Divulgação |
O Museu Nacional, a mais antiga instituição científica
brasileira e o museu mais antigo do país, foi destruído por um incêndio de
grandes proporções na noite deste domingo. As chamas começaram por volta de
19h30, quando o prédio histórico, na Quinta da Boa Vista, zona norte do Rio de
Janeiro, já havia sido fechado para o público. Segundo o Corpo de Bombeiros,
que conseguiram controlar as chamas por volta das 3h desta segunda-feira, não
há notícias de feridos. Havia apenas quatro vigilantes no local no momento em
que o fogo começou e eles conseguiram escapar.
Nas primeiras horas desta manhã, pequenos focos de
incêndio ainda persistem. Ao todo, 80 bombeiros e 21 viaturas participaram do
combate às chamas, que fizeram arder o edifício durante mais de sete
horas.
No domingo, imagens aéreas mostraram o edifício
completamente tomado pelas chamas e a dificuldade dos bombeiros de
controlá-las. Poucos minutos depois de deflagrado o incêndio, já havia setores
do prédio sem qualquer cobertura de telhado. "Não vai sobrar absolutamente
nada do Museu Nacional", afirmou o vice-diretor da instituição, Luiz
Fernando Dias Duarte, em entrevista à GloboNews. "Os 200 anos de história
do país foram queimados", disse. Na porta do local, professores, alunos e
pesquisadores choram enquanto presenciam a destruição.
Ainda não há pistas do que pode ter iniciado as chamas.
Segundo o Corpo de Bombeiros, o trabalho foi dificultado porque os hidrantes do
museu estavam descarregados e foi necessário pedir o apoio de carros-pipa.
Alguns pavimentos internos do prédio desabaram, mas os bombeiros conseguiram
retirar uma parte do acervo antes. Atuam no combate às chamas equipes de 20
quartéis do Rio de Janeiro.
O prédio foi criado por D. João VI e completou 200 anos
em 2018. O edifício é tombado pelo patrimônio histórico e foi residência da
família Real e Imperial brasileira. Sua estrutura é de madeira, o que permite
que as chamas se espalhem com mais facilidade. O prédio também sofria com a
falta de manutenção, como cupins que corroíam a estrutura e queda de reboco. Em
fevereiro deste ano, Alexander Kellner, diretor do museu, reclamou ao jornal O
Globo da falta de verba para a manutenção do local. "Felizmente essas
pragas [morcegos e gambás] não têm aparecido no acervo, mas ainda podem ser
vistas nas áreas comuns. O maior problema são as goteiras. Ficamos preocupados
quando cai uma tempestade porque só temos verbas para medidas paliativas de
prevenção."
O acervo do museu é composto por cerca de 20 milhões de
itens. Entre os destaques estão a coleção egípcia, que começou a ser adquirida
pelo imperador Dom Pedro I; o mais antigo fóssil humano já encontrado no país,
batizado de "Luzia", com cerca de 11.000 anos; um diário da
Imperatriz Leopoldina; um trono do Reino de Daomé, dado ao Príncipe Regente D.
João VI, em 1811; o maior e mais importante acervo indígena e uma das
bibliotecas de antropologia mais ricas do país. Até este momento não é possível
saber exatamente qual o dano provocado pelas chamas, mas, segundo um
funcionário da instituição que acompanhava o trabalho dos bombeiros disse à
GloboNews, toda a área de exposição do museu foi atingida.
A instituição, ligada à Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), vinha sofrendo com os cortes orçamentários há pelo menos três
anos. Alunos do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da
universidade, que atuam no museu, chegaram a criar memes em que mostravam
fósseis à espera de verba, ironizando os cortes, quando, na época, a previsão
era a de que só se receberia 25% do Orçamento previsto para pesquisa no ano.
Também em 2015, o museu chegou a ficar fechado por dez dias após uma greve de
funcionários da limpeza que reclamavam salários atrasados. Nas redes sociais,
pesquisadores, alunos e professores brasileiros também compartilham seus
depoimentos, lamentando o ocorrido e creditando a tragédia ao corte de custos
vivido nos últimos anos.
Ainda em entrevista à GloboNews, o vice-diretor do Museu
Nacional qualificou o incêndio como uma "catástrofe insuportável".
"O arquivo de 200 anos virou pó", disse. "São 200 anos de
memória, ciência, cultura e educação, tudo se perdendo em fumo por falta de
suporte e consciência da classe política brasileira. Meu sentimento é de imensa
raiva por tudo o que lutamos e que foi perdido na vala comum", ressaltou
ele, que afirmou que no aniversário de 200 anos da instituição nenhum ministro
de Estado aceitou participar da comemoração. "É uma pequena mostra do
descaso", disse ele, que afirmou que a instituição estava fechando uma
negociação com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES),
que incluía, justamente, um projeto de prevenção de incêndios. "Veja,
conseguimos isso junto a um banco. Nunca conseguimos nada do Governo
brasileiro. A universidade federal vive à mingua", desabafou.
O ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, afirmou em
entrevista à GloboNews que o ocorrido é parte do "processo de negligência
de anos anteriores". "Que isso sirva de alerta para que não aconteça
em outros museus. Medidas que poderiam ter sido tomadas anteriormente não foram
tomadas", destacou ele, que disse que foi feito um projeto para a
revitalização do prédio e os recursos foram levantados, "mas não deu tempo
de evitar a tragédia".
Em nota, o presidente Michel Temer afirmou que a perda do
acervo do Museu Nacional é "incalculável para o Brasil". "Hoje é
um dia trágico para a museologia de nosso país. Foram perdidos 200 anos de
trabalho, pesquisa e conhecimento. O valor para nossa história não se pode
mensurar, pelos danos ao prédio que abrigou a família Real durante o Império. É
um dia triste para todos brasileiros". O Ministério da Educação, ao qual à
UFRJ é ligada, também lamentou por nota e disse que "não medirá esforços
para auxiliar a universidade no que for necessário para a recuperação do
patrimônio histórico."
El Pais
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